Portimão: Misericórdia vende Quinta do Carriçal a promotor imobiliário
27-04-2011 8:16:00
A alteração do Plano Director Municipal de Portimão permitiu à Misericórdia local vender os 57 hectares da Quinta do Carriçal, a Norte do autódromo do Algarve, por 755 mil euros a um promotor imobiliário “holandês”. Pelo caminho ficou a comunidade terapêutica objeto de protocolo entre o Projeto Vida, autarquias algarvias e Misericórdia.
José Correia, atual Provedor da Misericórdia de Portimão, confirmou ao Observatório do Algarve o negócio: “a alteração do PDM, por causa do Autódromo, alterou o uso da propriedade e a Misericórdia vendeu o terreno em hasta pública à empresa de mediação imobiliária de um holandês (Carvoeiro e Branco), por 755 mil euros”.
Para o Provedor “cada um tem o direito de defender os interesses que representa”, ao justificar ter avançado com alienação do terreno. Este fora adquirido por 30 mil contos em 1995, cerca de 150 mil euros. E destinava-se à criação de uma comunidade terapêutica e para reabilitação de toxicodependências.
Ainda que as autarquias tenham contribuído na altura com um total de 34 mil contos (cerca de 170 mil euros) “a sua comparticipação para a compra do terreno, proporcional ao Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF) foi devolvida, na altura em que conseguimos vender” garante José Correia.
E nega “perentoriamente” ter recebido os 47 mil contos (234,4 mil euros) disponíveis no Projeto Vida através do Serviço de Prevenção e Tratamento da Toxicodependência (STPP), atual Instituto da Droga e Toxicodependência (IDT) para a comunidade terapêutica do Carriçal, alegando que a verba “nunca foi entregue, porque o projeto não avançou e o dinheiro só poderia ser usado na obra”.
De Comunidade Terapêutica a “Aldeia Inclusiva”?
Agora, ainda segundo José Correia, o promotor imobiliário terá disponibilizado “como contrapartida, uma parcela de terreno da quinta para instalar uma Aldeia Inclusiva” equipamento social a desenvolver pela Misericórdia e pela autarquia de Portimão, não avançando o entanto a dimensão de terreno a disponibilizar.
“Já houve reuniões com arquitetos e psicólogo da SGU Portimão para a instalação de um centro comunitário alargado, com alojamento e áreas ocupacionais” conta o responsável da Misericórdia.
O autarca Manuel da Luz anunciara publicamente, a 6 de janeiro deste ano, a intenção de a câmara construir “uma aldeia de raiz, num projeto-piloto que implicaria a candidatura a fundos nacionais e comunitários e o estabelecimento de parcerias com instituições de solidariedade e com privados”, adiantando existirem já dois interessados em investir.
Plano de Pormenor do Carriçal deverá avançar este ano
Para a localização da ‘Aldeia Inclusiva’ Manuel da Luz apontava o Carriçal, afirmando existirem já “negociações com o dono de um terreno”, sendo o projeto para construir por fases, até uma capacidade de cerca de 150 pessoas, englobando várias valências, entre elas um centro de acolhimento temporário para idosos, unidade de realojamento, centro de educação intergeracional, bem como unidade de promoção de produtos tradicionais e incubadora de pequenas empresas.
Para tal, seria executado um Plano de Pormenor da zona, a lançar ainda este ano, embora o autarca não avançasse o valor do investimento na Aldeia Inclusiva, cujo objetivo seria aumentar respostas sociais e, simultaneamente, desenvolver o interior do município.
Fonte da autarquia de Portimão confirmou ao Observatório do Algarve o “empenhamento na construção do equipamento social Aldeia Inclusiva, não havendo, no entanto, até ao momento a definição da sua localização.”
Carriçal – Uma história atribulada
O projeto da Quinta do Carriçal remonta a 1995, envolveu o então presidente da ARS Algarve Carlos Martins, que notificou a existência do terreno, propriedade da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Portimão e considerou existirem aí condições para a instalação da Comunidade Terapêutica, pelo que o STTP/IDT inscreveu a verba em PIDDAC para a sua aquisição.
Contudo, a Misericórdia já se teria adiantado na aquisição do terreno pelo que à instituição, se associam o Projeto Vida e as autarquias, protocolo assinado em 5 de novembro de 1996.
José Correia afirma que as autarquias “levaram mais de dois anos a concretizar a entrega das verbas” sendo por isso obrigado a “reforçar junto do banco o valor da propriedade, que ficou por trinta mil contos, (150 mil euros) quando o negócio se fizera por 20 mil”.
“O então Ministro Vitalino Canas disse-me que o Estado já não precisava mais de camas nessa área”, afirma por sua vez o ex-provedor Sr. Serralha, que acompanhou o processo desde início.
Opção que não é confirmada pela então delegada regional do projeto Vida, a atual governadora civil Isilda Gomes que precisou ter aquele departamento ficado a aguardar “por mais de três anos o projeto da Misericórdia, até porque já havia verba disponível para avançar”.
Autarquias querem 10 anos de juros
Pouco pacífica foi igualmente a devolução da quantia das autarquias que só foi efetuada em 2008, ou seja, mais de 10 anos depois de ser entregue.
A Assembleia Municipal de Albufeira, por exemplo, aprovou sobre esta matéria uma proposta a 19 de Agosto de 2008 em que contesta “a restituição a este Município da verba entregue em 1996 para aquele efeito (comunidade terapêutica) no valor de 9.975,95 euros, em singelo sem qualquer tipo de contrapartida acrescida, nomeadamente juros, sendo certo que pelo período de cerca de dez anos (a Misericórdia) usufruiu daquele montante enquanto este Município se viu privado do mesmo”.
Na proposta, aprovada por unanimidade, a AM delibera “reclamar junto da Santa Casa da Misericórdia de Portimão uma compensação pela devolução tardia e singela daquele valor”.
Tal reclamação deveria, no entanto ser feita no âmbito da AMAL, que representaria todos os municípios no processo, o que a Misericórdia “recusou”, segundo José Correia.
Privados abrem comunidades em Faro e Silves
Em 20 de Maio de 2009 o Ministério da Saúde, em resposta a um requerimento da deputada Jovita Ladeira entregue na Assembleia da República, questionando o ponto da situação da Comunidade Terapêutica do Carriçal, faz o longo historial do projeto, dizendo que só em 2000 a Misericórdia tinha manifestado a sua intenção de concretizar a comunidade.
E, para o Ministério da Saúde, é a última ‘notícia’ sobre o Carriçal pelo que se manifesta "impossibilitado de avaliar" a viabilidade do projeto pois “não há conhecimento se a comunidade estará a funcionar” assegurando porém não ter entrado, até 2009 “qualquer requerimento com vista ao licenciamento de tal equipamento”.
Entretanto, desde 1995 em que se iniciou a compra do terreno, agora destinado ao imobiliário e até 2009, abriram no Algarve duas comunidades terapêuticas privadas, uma Faro e outra em Silves, com capacidade respetivamente para 30 e 22 utentes “o que se nos afigura suprir as necessidades do distrito de Faro”, responde o ministério à deputada.
Conceição Branco
Observatório do Algarve
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