sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Santa Casa da Misericórdia de Albufeira

A mais antiga associação do concelho de Albufeira
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Santa Casa da Misericórdia em tempo de mudança

Dr. Carlos Vargas, um irmão atento, dá a sua opinião
Sendo a mais antiga associação do concelho de Albufeira, a Santa Casa da Misericórdia, nascida há mais de cinco séculos, tem desenvolvido uma acção substantiva na área da solidariedade social.
Como tudo na vida poderá sofrer os efeitos da erosão do tempo, surgem novas ideias para uma melhor ou mais adequada gestão.
O Dr. Carlos Vargas, um dos mais ilustres albufeirenses, que atingiu importantes cargos nas áreas financeiras e de empreendedorismo, revela-nos em entrevista as suas preocupações, quanto ao futuro da Santa Casa da Misericórdia de Albufeira.
a Avezinha – Fazendo parte da irmandade da Santa Casa da Misericórdia de Albufeira, ainda que recentemente, considera que não funciona como deseja?
Carlos Vargas – Sim, há cerca de 3 anos que regressei a Albufeira depois de 40 anos de ausência. Logo que voltei, interessei-me pelo destino e acontecimentos relativos à irmandande da Stª Casa de Albufeira que é a mais antiga instituição do concelho pois já comemorou 500 anos. Verifiquei que tem problemas de gestão.
Ao longo da minha peregrinação ultramarina tive a oportunidade de dar o meu contributo a outras Santas Casas.
aA – Isso pressupõe que está disponível também para dar o seu contributo a esta já que tem muita experiência?
C.V. - Com certeza que estou disponível porque quando nos tornamos sócios ou irmãos de uma organização, os estatutos definem claramente quais os direitos e obrigações. Mal está quando nós chegamos a uma instituição e só queremos ter os direitos esquecendo as obrigações que começam por ser uma participação activa na vida da instituição. A minha como irmão tem sido participar de forma positiva por vezes crítica mas sempre no lado positivo, por vezes crítico mas sempre no lado positivo, em assembleias gerais que têm ocorrido.
Não falhei a qualquer assembleia geral para a qual tenha sido convocado.
aA – Constata que não existe liderança?
C.V. - Constato que há uma fraquíssima participação numa instituição que tem mais de 500 anos.
É muito triste chegarmos à conclusão que num município com cerca de 40 mil residentes, sendo seguramente menos de metade naturais de Albufeira, apenas segundo me disseram antes vinham uma dezena de pessoas mas que agora aparecem nas assembleias 2 ou 3 dezenas de sócios.
aA – É uma tomada de consciência de que existe pouco interesse dos irmãos?
C.S. - Há alguns que têm vindo a participar talvez por curiosidade e por haver muitas questões sobre os actos de gestão praticados na tesouraria.
As deliberações eram tomadas por unanimidade e as intervenções eram quase nulas. Dada a minha formação tenho sido um interlocutor activo enquanto irmão na mesa da provedoria.
Julgo que não tenho sido muito bem recebido pois as questões que tenho apresentado e os contributos que tenho dado não têm sido acolhidos de forma natural.
É preciso forçar a nota para que aquilo que é evidente seja aceite, o que é lamentável.
É tão lamentável quanto o estado de saúde económico -financeiro da instituição que é de facto preocupante.
A minha intervenção tem sido permanente porque há déficits de exploração. Uma instituição de solidariedade social não se mede pelos resultados e saldos positivos no final do ano mas exactamente pelas prioridades a acudir. A preocupação de natureza social devido à exclusão e à ausência de solidariedade que devia ser praticado pelos demais cidadãos significa que a Santa Casa da Misericórdia ou qualquer IPSS deve fazer o esforço possível para ser mais transparente e não haver desperdício.
No caso da Santa Casa de Albufeira é gritante o desperdício e a ausência de racionalidade de gestão.
Explicitando: Tenho tido informação de uma prática sistemática de um poder praticado de forma avulsa e repetida sem qualquer fundamentação. Há queixas de trabalhadores que têm sido vítimas de actos reprováveis por alguns membros mais ligados à gestão.
Não era prática prestar contas aos irmãos. A transparência que as instituições devem ter só as robustece e as valoriza, pois assim poder-se-à demonstrar que tudo é feito om as boas práticas seguindo os princípios deontológicos.
aA – O boletim que publicam não refere os factos de ordem informativa?
C.V. - O boletim tem título de informativo mas é uma divulgação promocional, o que não ajuda a resolver qualquer coisa.
aA – As estruturas são suficientes ou excessivas?
C.V. - Segundo informação que tem sido prestada há mais de duas centenas de trabalhadores servindo cerca de 5 ou 6 centenas de utentes. Tem uma dimensão que implica a existência de competências, não só por parte dos quadros mas também por parte dos dirigentes. Nas instituições há os funcionários e os dirigentes e hoje, que as exigências são cada vez maiores, a existência de dirigentes com qualificação é absolutamente indispensável.
No caso da Santa Casa da Misericórdia de Albufeira, esta dimensão e o facto de gerir anualmente cerca de quatro milhões de euros, significa que deve ser dotada do melhor possível.
A questão que se coloca é que não me parece que a Santa Casa tenha o melhor possível. O melhor possível não é só ter pessoas mas a prática de metodologias e competências que não têm sido oferecidas.
aA – Das várias valências há alguma que seja mais deficitária?
C.V. - Diria que na acção social tem havido muitas falhas. Primeiro é a instituição mais antiga do concelho. No passado, talvez há 50 anos, não tivesse possibilidade de fazer muito mais do que fez porquanto o tecido sócio-económico de Albufeira era pobre. Era a acção social possível à data.
O que é inadmissível é que apesar do enriquecimento que o município assistiu a partir dos anos 60 a Santa Casa tenha estagnado. Diria até que regrediu, o que não aconteceu com outras Santas Casas no país.
Por exemplo em municípios que não tiveram estes progressos os irmãos e os dirigentes conseguiram atingir níveis de exigência, de abrangência social e de serviços notáveis.
A Santa Casa de Albufeira dedicou-se a actividade que não eram do objecto estatégico-social e não cuidou da prestação de serviços no concelho, permitindo que outros agentes de solidariedade social tenham ocupado esses espaços. Estou a falar do Lar da Guia, das Ferreiras e mais recentemente em Albufeira.
O facto de ter antiguidade, deviam também ter a experiência e ocupar aquilo que lhe era devido. Antes pelo contrário, pois pelo que me é dado conhecer há um ambiente de mau relacionamento institucional com as várias entidades públicas e privadas e particularmente com a autarquia, independentemente da situação política -partidária que por lá passou. Algo se passou na continuidade da Santa Casa da Misericórdia de Albufeira que permitiu que as outras estruturas construídas com fundos públicos tenham sido entregues a outras entidades que não têm a obrigatoriedade social que a Santa Casa tem.
Prosseguindo: Não foi a autarquia que teve a dificuldade de relacionamento porque houve rotatividade democrática mas o que não houve foi alteração do percurso da Santa Casa porque esteve enquilosada durante 30 e tal anos.
Se assim foi, a autarquia viu-se forçada a encontrar várias soluções e portanto apareceram outras instituições. São meros prestadores de serviço mas a Santa Casa tem obrigação de fazer muito mais porque ao longo de 5 séculos acumulou legados que são sua pertença.
aA – Considera que é necessário haver uma chicotada, uma mudança?
C.V. - Acho que é indispensável que haja uma alteração por várias razões:
Primeiro - não é possível continuar a afogar a instituição
Segundo - houve uma alteração extensa no tecido económico-social que irá perdurar por muito tempo.
O estado social tem o seu limite e estará neste momento num processo de regressão pois não há capacidade financeira para manter o que já está. Esta é a realidade e é melhor que estejamos convictos da falência do estado social, por muito injusto que possa ser.
Nessa medida mais importante é a eficiência e o papel das IPSS.
aA – Quer dizer que há funcionários a mais?
C.V. - Não posso dizer isso mas há que fazer muito mais e seguramente estarão dispostos a fazê-lo. É um problema de liderança e de interpretar prospectivamente o que vai acontecer.
Julgo que os cidadãos de Albufeira têm a sua opinião sobre o que é esta Santa Casa. O divórcio é evidente. Há eleições previstas ainda este ano e tanto quanto sei há irmãos interessados em encontrar uma situação robusta, capaz, competente e com transparência.
AA – O Dr. Carlos Vargas está disponível para essa acção?
C.V. - Poderei dar a minha contribuição. Não sou candidato porque entendo que há outras pessoas com mais disponibilidade de tempo do que e. Tenho outras activdiades mas não renego a minha colaboração, nomeadamente no que é o aconselhamento tão intenso quanto necessário da gestão financeira e patrimonial da Santa Casa da Misericórdia.
aA – Há pouco referiu-se que há situações impensáveis e que está em causa a pastelaria Jasmim.
C.V. - Está em causa a gestão da unidade de pastelaria que não faz sentido, até porque sabemos que acarretou muitos prejuízos ao longo da sua existência. Foi deliberado na última assembleia o seu encerramento no 1º semestre mas desconheço se isso aconteceu.
Há outras unidades de actividade que são questionáveis como as de prestação de serviços nas áreas de formação e reintegração.
Espero que de uma forma pacífica se consigam resolver estes problemas. Lamentavelmente já assisti a alguns irmãos com atitudes reprováveis mas felizmente o presidente da Mesa da Assembleia tem conseguido com a sua atitude travar essas situações.
Desejo que neste processo que deve ser de renovação haja um acordo com princípio de ética de respeito e competência. Está em causa a continuidade da instituição, servindo mais e melhor os que necessitam. Todos os concelhos merecem uma Misericórdia e hoje ainda mais porque com a falência do estado social ela terá que dar apoio aos menos favorecidos.
O Estado é uma entidade abstrata, fria e portanto serão os cidadãos e homens bons que ajudam os que mais precisam.
Quando as misericórdias têm dirigentes com espírito aberto, essas instituições criam parcerias que podem ajudar a resolver os problemas.
Albufeira não tem um centro de enfermagem de cuidados primários. Dantes havia farmácia perto da praia e agora nem isso. Não faz sentido que a Santa Casa não tenha um posto de enfermagem. Tem um edifício na rua 5 de Outubro, que vende não sei o quê e tem umas meninas a fumar à porta. Esta é que é a triste realidade.
Julgo que os cidadãos de Albufeira têm a sensação de que a Santa Casa é uma instituição sem rei nem roque e que faz com que as pessoas se desinteressem.
Tenhamos misericórdia da Misericórdia de Albufeira, dizem alguns dos albufeirenses mais atentos.

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