sábado, 13 de dezembro de 2008

Santa Casa da Misericórdia do Porto

Reclusas em família no postal de Natal
Filhos de mulheres detidas foram premiados com computadores e vestuário após passarem para o papel o desejo de festejar a quadra com as mães
Ontem
CARLA SOARES
Uma casa, com mãe e filha a passarem o Natal sob o mesmo tecto. Alexandra passou o seu desejo para o papel e, com ele, foi uma das vencedoras do concurso para o melhor postal natalício, promovido entre os filhos das reclusas de Santa Cruz do Bispo, em Matosinhos.

Consigo levou prémios que chegam aos mil euros, mas o desejo ainda vai ter de esperar pelo menos um ano. E o de ser veterinária, muitos mais.

Dentro de uma semana, terão passado três anos desde que Maria de Lurdes Batista está detida. "Não passei nenhum Natal com a minha filha", contou, ao JN, esperançada que esta seja a última vez que passa a quadra no Estabelecimento Prisional Especial de Santa Cruz do Bispo. "Espero sair para o ano, já chega", desabafou, recordando que está presa por "roubo" e "por causa das más companhias". "Era a alegria maior que eu tinha", confessava, por sua vez, o pai da reclusa, que passa os natais com a neta.

Alexandra Marlene, explicava, por sua vez, a ideia para o postal: "queria passar o Natal com a minha mãe, por isso tinha de a pôr no desenho". Fê-lo num dia e, em troca, ganhou vestuário, calçado e um computador que totalizam os mil euros. "Ela não tinha computador. Vai receber o Magalhães mas não sei quando", contou Maria de Lurdes, enquanto a filha dizia preferir, de todas as prendas, o computador, não só para estudar mas também para os jogos.

O concurso de postais, em parceria com a Santa Casa da Misericórdia do Porto e a empresa Ferrovial, teve mais dois vencedores empatados no primeiro lugar, sob o tema da aproximação da família.

Luís Filipe, de 12 anos, desenhou uma casa, uma lareira e um Pai Natal a colocar lá os presentes. Um cenário a que também queria acrescentar a mãe. "Ela não vai estar. Se estivesse eu ficava mais feliz", disse, ao JN, enquanto a mãe explicava que não vai passar a consoada mas estará com o filho no sábado. E prevê ir a casa a 20 de Janeiro porque faz anos. Detida "por causa da droga", vai esperar mais "cinco meses" para sair em liberdade e poderá passar as próximas festas com o filho, um dos nove que tem, além de 30 netos. Luís Filipe Robalo, que frequenta o quinto ano, garante que vai usar o computador "mais para estudar". Mas não esconde a preferência pelos outros prémios, sobretudo a nova roupa que vai ter.

O primeiro lugar é, também, de Purificación Afonso Soares. A mãe, Ana Oliveira, já não está no estabelecimento prisional, saiu há um mês, a tempo de passar o Natal em família. "A vida não está fácil lá fora, é bastante dura, mas vou com calma e tudo corre bem", conta a ex-reclusa. "Agora, vou aproveitar para estar com as minhas filhas e recuperar o tempo perdido", diz, após três anos e quatro meses de detenção por tráfico de estupefacientes".

Purificación, de 13 anos e no sétimo ano, está "muito mais contente" desde que a mãe saiu da prisão. Apesar de partilhar o espírito do concurso, "não queria participar", conta Ana recordando que a teve de convencer. No fim de contas, até venceu e foi a primeira a ser chamada. "Sempre dizia que não tinha jeito", justifica a concorrente, que se inspirou num desenho que o irmão tinha feito e pintou um anjo.

Na hora do balanço da iniciativa, saltou à vista o reduzido número de participações: onze desenhos somados pelos vários escalões etários, dos cinco aos 15 anos. E isto num universo de 254 reclusas.

A directora-geral dos Serviços Prisionais, Maria Clara Albino, garantiu, por sua vez, que a perspectiva é a de repetir o concurso no próximo ano, sobretudo porque "promove a aproximação entre mães e filhas e chama o valor da família de forma pedagógica". E espera ter mais concorrentes.

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